segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Cinema, fotografia e sustentabilidade: distopias suaves

Mais uma vez uso o cinema e a fotografia para refletir. Por iniciativa do Coletivo Atalante (coletivoatalante.blogspot.com.br), na Cinemateca de Curitiba foi exibido ontem o 4:44 Último dia na terra, filme de Abel Ferrara lançado em 2011. De forma quase serena, o filme narra a espera pelo extermínio da humanidade, devido ao esgotamento quase que por completo da camada de ozônio. Os cientistas previram que isto ocorreria às 4:44 de determinado dia, e acompanhamos as últimas 14 horas vividas por um casal – Cisco e Skye – interpretados por Williem Dafoe e Shanyn Leigh. Não há pânico e nem violência nessa distopia suave que Ferrara nos apresenta.
No mesmo espaço da Cinemateca, uma exposição fotográfica de Rodolfo Massambone – Contenções – explora, assim como Abel Ferrara, a relação entre homem e natureza. A exposição integra a programação do FIDÉ Brasil 2015 – Festival Internacional do Documentário Estudantil. Em suas fotografias, Massambone mostra a resistência da natureza às contenções que o concreto armado, obra humana, tenta lhe impor. Flores e árvores brotam de rachaduras e espaços abertos no canal construído para domesticar o Rio Belém que cruza a cidade de Curitiba. A rebeldia da natureza, persistindo em sobrepujar as contenções humanas, da forma retratada pelo fotógrafo, me leva a imaginar que suavemente, ao longo dos anos, a natureza se imporá aos humanos.
A distopia suave de Ferrara e a fotografia de Massambone me provocam. Fazem com que seja impossível para mim, não voltar ao tema da sustentabilidade na literatura dos estudos organizacionais. É mesmo possível que teremos, no futuro, gestores capazes de levar a humanidade a superar o desafio que diz respeito à harmonização de objetivos sociais, ambientais e econômicos, baseando-nos no duplo imperativo ético de solidariedade sincrônica com a geração atual e de solidariedade diacrônica com as gerações futuras(VEIGA, 2008, p. 171)?
Devo confessar que, no atual momento de minha trajetória, enxergo essa possibilidade com ceticismo. Nossa sociedade ainda tem um caráter egocêntrico e humanocentrico que torna muito difícil superar as limitações de uma gestão organizacional orientada prioritariamente pela maximização do lucro.
Nessa reflexão, nesse momento, me vem à memória, uma das primeiras leituras que fiz sobre as questões ambientalistas, ainda à época de meu doutoramento na Universidade de Manchester nos anos 90 do século passado. Desde aquela época, costumava frequentar sebos em busca de livros mais baratos. Em uma de minhas viagens a Londres, encontrei dois livros de bolso de James Lovelock – Gaia: a new look at life on Earth (1979) e The Ages of Gaia (1988). É claro que não lembro de detalhes desses textos que li há mais de trinta anos. Mas, uma impressão me ficou dessas leituras. A ideia de que a Terra é um organismo vivo que se adapta à presença do homem na sua superfície. Pode ser que ela sobreviva aos humanos. O filme de Ferrara e as fotografias de Massambone me dizem que isto é provável.
Nesse domingo em que o frio do outono curitibano nos força a buscar outras fontes de calor, me apoio na Esperança. Espero que sejamos capazes de sensibilizar nossos alunos de Administração para que não façamos Gaia se livrar de nós. Vamos respeitá-la e continuar nossa busca por um mundo sustentável, onde as dimensões ambiental e social sejam prioritárias em relação ao lucro.
VEIGA, J. E. da Desenvolvimento sustentável: o desafio do século XXI. 3ª. ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2008.

Nenhum comentário:

Postar um comentário