quinta-feira, 26 de agosto de 2021

Na biblioteca, um conto surreal

O relato de Arthur Gordon Pym, o solteirão nobre, foi sobre a mulher mais linda da cidade, Lucíola, a mulher do Silva. Eram histórias sicilianas, histórias de amor e de vagões e vagabundos.
O desejo pego pelo rabo, enquanto a noite não chega. Orgias em paraísos artificiais, amor de perdição entre a cidade e as serras, e sem plumas. Um escândalo na Boêmia.
O grande deflorador  e a mulher de trinta anos. Em uma casa de pensão, armadilha mortal, com a luneta mágica e o colar de veludo. Que loucura! Uma temporada no inferno de espumas flutuantes.
Aurélia, a moreninha, Iracema, a mensageira das violetas, Carmen, a ciclista solitária, e Marília de Dirceu, a bela adormecida liam cartas portuguesas. Dançar tango em Porto Alegre com Esaú e Jacó queria a viuvinha. Viva e deixe morrer, senhora, a propriedade privada é um roubo. Dizia a megera domada. O marido complacente, o gaúcho, teve sonho de uma noite de verão. Acordou e se despediu: adeus, minha adorada.
Em cinco minutos, no cortiço, a ilustre casa de Ramires, de repente acidentes. Uivo do alienista. O gato no escuro. Romeu e Julieta unidos para sempre. Os crimes do amor. O monstro da gruta.
Antes e depois, os bandoleiros, no Cassino Royale, sem gentidades, pediram ajuda ao pirotécnico Zacarias, o sertanejo. Causaram os sofrimentos do jovem Werther, o vampiro de Sussex.
Após dias e noites de amor e guerra, uma noite na taverna e o duelo. O triste fim de Policarpo Quaresma no vale do terror.  Enquanto isso, a mãe do Freud  abria a correspondência de Fradique Mendes e Teresa filósofa fazia um estudo em vermelho.
Em o livro dos sonhos,  notas de um velho safado. Don Juan, com sexo na cabeça: a flecha de ouro, a primeira coisa que botei na boca, a ninfomania, a mão e a luva.
Enfim, o primo Basílio, o mulato, implorou a Iaiá Garcia. Besame mucho!
Ou teriam sido apenas confissões de um comedor de ópio?

Conto montado com os títulos de 85 livros

quinta-feira, 5 de agosto de 2021

Alter ego

Observa a vida. Muitas vezes, desapercebido, fica horas calado em seu canto. Discreto. No vestir. No caminhar leve. No falar bem calmo. Em tom baixo, quase sempre. Quase inaudível para alguns. Exceto, quando com amigos. No calor da amizade, a fala se torna mais alta. Mas, na maior parte do tempo, embora presente, é como se não estivesse. Invisível, mas não por vontade própria. Vezenquando a exclamação: Você está ai! Não tinha visto.
A resposta é um arquear de ombros, espalmando as mão para a frente dos braços quase esticados. Um pouco curvados como se fossem um par de parenteses. Contendo o silêncio de uma resposta que, se dada, seria redundância pura: Claro. Não está vendo?
Apenas move ombros, braços e mãos. Logo se esquecem dele. Se mantém observando. Deveria ter se tornado um cientista.
Mas, os caminhos da vida são estranhos. Não. Não pense que falo de destino. Nada disso! Firme convicção na escolha própria. O problema é que, vezenquando, é a escolha do possível. Não do desejado. Como já disseram, o caminho se faz no caminhar. O destino é consequência do caminho. Às vezes alvo, às vezes ponto de chegada. Nem sempre coincidem. Ele tem um amigo, estrategista, que diria que é mistura de deliberação e emergência. Planejado e decidido conforme o caso. Deliberado antecipadamente e fruto de ajustes às circunstâncias de cada momento. Concorda com ele.
Algo parecido com o que aconteceu neste trecho. A ideia era falar do que se tornou. Oposto ao que as aparências indicavam. Porém, escrevi sobre o destino que se escolhe. Mas, também, que se nos oferece. Ao final e ao cabo, uma mescla de tudo.
Quer saber? Virou escritor. Penso que por vontade própria. Mas, também,  por premência da vida. Nessa quietude que lhe marca, a escrita se tornou a fala não dita. Bendita ou maldita? Uma mistura. Vezenquando uma. Outra, noutras vezes. Acho que sua escrita é uma resposta alternativa ao arquear de ombros e espalmar de mãos. Como se afirmasse: Estou aqui sim. Preste atenção.
Pode parecer, como disse Guimarães Rosa, ao descrever um personagem em "Tarantão, meu patrão", quieto como um copo vazio. Mas, vezenquando, as letras falam por ele. Enquanto elas não se juntam em orações, períodos e parágrafos, segue prestando atenção. É o seu destino. E também seu jeito. Afinal, escritor-observador.