sábado, 13 de março de 2021

Medo em uma sexta-feira 13

Há um ano, eu tive medo. Era sexta-feira, dia 13 de março. Mas, meu medo não teve nada a ver com a superstição popular. Sexta-feira 13, dia de azar. Nenhum gato preto passara por mim.  Mera coincidência!
Eu estava na universidade desde a manhã. À noite, teria um encontro com a turma da disciplina de Direito nas Organizações. Seria o segundo encontro da disciplina, cujas atividades haviam se iniciado na sexta-feira anterior.
Depois do almoço, perto da universidade, voltei para minha sala. Acompanhava as notícias sobre a Covid-19. Dois dias antes, a Organização Mundial de Saúde já havia declarado que a humanidade enfrentava uma pandemia.
Essa notícia se associou a um desconforto que eu sentia. Devido à impossibilidade de contratar um professor da área de Direito, eu havia assumido aquela turma. Precisava me preparar para discutir com os estudantes um assunto que não dominava. Mas, havia assumido este compromisso. Tinha que enfrentá-lo. Com um pouco de medo!
O primeiro encontro não tinha sido tão ruim. Meu foco estaria em apresentar aos alunos conceitos fundamentais do Direito e sua aplicação nas organizações. Seria guiado por uma questão central: como profissional de Administração, de que forma interagir com esse campo de conhecimento que, além de indicar ações e decisões que são legalmente adequadas, demanda uma capacidade de interlocução com os profissionais do direito? Afinal, nosso curso pretende formar profissionais da Administração. Não do Direito! Tinha medo, mas me sentia capaz de enfrentar o desafio.
Para isso, me apoiaria em dois livros básicos que encontrei na biblioteca setorial. Também, garimpava notícias e casos que pudessem ilustrar as questões do direito com que nos deparariamos ao longo das quinze semanas previstas para o primeiro período de 2020. Seria difícil, mas não impossível!
Contava, ainda, com a possibilidade de apoio de amigas e amigos do campo do Direito que fariam palestras para a turma. A primeira, inclusive, já fora agendada para o terceiro encontro, no longínquo 20 de março de 2020.
Longínquo? Você pode até me questionar. Sim, apesar de ser apenas um ano, me dá a sensação de estar muito longe no tempo! Como coube tanta dor e sofrimento em apenas um ano? Não esse ano parece que durou mais que 365 dias!
Mas, fujo do assunto. Retorno a ele. Um ano atrás, só em minha sala, uma angústia forte. Um conflito existencial. O que fazer? Esperar o horário da aula, 19 horas, e ir ao encontro da turma? Ou ir para casa e começar este ano de distanciamento social? Tive medo! No meio da tarde, enviei uma mensagem de correio eletrônico à turma. Basicamente, informei que estava cancelando o encontro daquela noite. Pedi desculpas pelo aviso em cima da hora. Informei que, na semana seguinte, decidiriamos sobre uma eventual reposição ou atividade substituta. Pensava que na semana seguinte a situação estaria melhor. Ignorância ou auto-engano? Uma mistura de ambos provavelmente.
Dois dias depois, as aulas da UFPR teriam sua primeira suspensão. Por 15 dias. Havia esperança de que a situação não durasse muito. Frustrada!
Estamos há um ano sem aulas presenciais. Nesse tempo, eu e muitos colegas ofertamos aulas à distância. Aprendemos a fazê-lo de forma compulsória. Alguns são muito competentes nisto. Outros menos. Me incluo no segundo grupo. Mas, sigo na esperança que eu tenha dado a oportunidade para que parte de nossas alunas e nossos alunos possam ter refletido e aprendido sobre Ética nas Organizações e Administração do Terceiro Setor. Ontem encerramos as atividades de duas turmas de Ética nas Organizações.
Pois é! Naquela sexta-feira 13, tive medo. Um medo nem um pouco supersticioso. Pelo contrário, penso eu. Foi um medo da espécie humana. Um medo ligado à sobrevivência. Um medo que não tive medo de sentir. Ou de assumir. Saindo do prédio onde trabalhamos, encontrei um colega de trabalho. Contei a ele que cancelara as aulas da noite. Ia para casa. Ele me informou que era praticamente certo que as aulas seriam suspensas a partir da segunda-feira. O que aconteceu de fato.
Estava com medo naquela sexta-feira 13. Hoje não é sexta-feira 13, mas o medo ainda se faz presente. Me protejo. E continuo vivo!