sexta-feira, 6 de maio de 2016

O ATIVISTA CORDIAL

Hoje, em uma estação tubo, havia um ativista. Um ativista cordial. Eu aguardava meu ônibus. Estava a caminho do campus Botânico da UFPR. Começo de mais um dia de trabalho. Distraído, acompanhava a repercussão do afastamento de Cunha da presidência da Câmara de Deputados e suspensão de seu mandato pelo Facebook. O ônibus chegaria em vinte minutos conforme o portal de informações da estação tubo. De repente, um conflito sereno começou a se desenvolver ao meu lado.
Conflito sereno pode parecer um oximoro, mas penso que você concordará com o uso do adjetivo nesta situação. Um sujeito alto, magro e de cabelos cacheados, perto de seus 40 anos, apesar de um pouco grisalho, entra na estação e se posta ao meu lado. Eu estava recostado em um tubo metálico que serve para dar algum conforto, pouco, na falta de bancos nas estações tubo, àqueles que aguardam a chegada de seu transporte. Não notei a chegada dele. Logo depois, vejo o cobrador da estação tubo se aproximar e dirigir-se ao sujeito recém-chegado. Um diálogo conflituoso começou:
_ Você pulou a catraca e não pagou a passagem. Isso não pode.
_ Eu sei. Respondeu o sujeito.
_ Então, volta lá e paga. Não é a primeira vez que você faz isso.
_ Eu sei. De novo, a mesma resposta.
Nisso, eu me afastei alguns centímetros, mas me conservei encostado no apoio. Temi que a coisa pudesse se tornar mais agressiva. Já passei da idade de levar um sopapo eventual ou um empurrão que sobrasse de uma possível luta entre dois homens perto de mim. Mas, o diálogo continuou sereno. Nem o cobrador, tampouco o sujeito alteraram o tom de voz. O cobrador, de baixa estatura, manteve-se firme:
_ Todo mundo que está aqui pagou a passagem. O que você está fazendo não é justo.
_ Eu não concordo com o preço da passagem.
_ Se não concorda vai à prefeitura. Aqui tem que pagar.
_ Mas, eu não concordo.
_ Você acha que sua atitude não me afeta? Eu sou responsável pelo que acontece aqui.
_ Eu sei.
_ Vou chamar a Guarda Municipal. Eles são rápidos. Você é que sabe.
Nisso, o cobrador pega o celular, digita um número e se dirige a seu lugar. Havia mais passageiros querendo entrar na estação tubo. Ao mesmo tempo, chega meu ônibus. Entro. Outros passageiros também o fazem. O sujeito que pulou a catraca também entrou. Logo depois, o cobrador entra e se aproxima do motorista que já dera o comando de fechar as portas. As portas reabrem. O cobrador diz, se dirigindo ao sujeito:
_ Você não vai. O ônibus não parte enquanto você não sair.
_ Mas eu não concordo, respondeu o sujeito.
_ Não importa. Com você aqui dentro o ônibus não sai.
Nessa altura, pensei comigo:
_ Vou chegar atrasado a meu compromisso.
Tinha agendado uma sessão de orientação com Bia, doutoranda em Administração. Mas, para minha surpresa, o sujeito se retira do ônibus dizendo:
_ Não concordo com pagar passagem para me transportar.
O motorista comanda o fechamento das portas. O sistema de som informa:
_ Portas fechando.
Eu sigo com os olhos o sujeito. Na estação tubo, ele olha para dentro do ônibus.
É um olhar triste, mas tranquilo. Em seguida, desce da estação tubo. Eu reflito com meus botões:
_ Lá se vai um ativista cordial.
Deveria se dirigir para o outro tubo no qual passa outra linha na mesma direção para onde ele pretendia ir. Não é muto longe da estação onde estávamos.
Espero que tenha tido sucesso na outra estação tubo. Será que vai topar com um cobrador tão cordial também?

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