terça-feira, 30 de agosto de 2016

Em que mares?

Alexander tem dificuldades de falar com Dirk, seu amigo que capitaneia um navio transportando carga de um museu em algum mar qualquer. A conexão da internet é instável. Ele vê o amigo, mas este só ouve sua voz. Dirk quer esquecer o passado. Falar só do presente. A conexão é perdida. Alexander lamenta:
_ Foi tão rápido. Nem pude lhe perguntar em que mares navega.
Assim começa Francofonia, documentário de Alexander Sokurov, uma produção franco-germano-holandesa que assisti hoje. Belíssimo passeio pelo Museu do Louvre e parte de sua história durante a ocupação nazista de Paris.
O lamento de Alexander me leva ao passado recente. Ontem. Final da tarde. Pouco mais de cinco horas. Peço ajuda de Leandro, doutorando em Administração, sobre como preparar dados em uma planilha para análise de redes. Rodrigo, também doutorando, ao lado de Leandro, comenta:
_ Navegando outros mares, professor.
Rodrigo se refere a passagem de um livro de Rubem Alves que usei em um de nossos encontros na disciplina de Empreendedorismo no semestre passado. Rubem Alves se refere ao professor como um navegante de muitos mares que tenta ensinar aos alunos o que sabe sobre os mares. Mas, em algum momento, alguém pergunta sobre um mar desconhecido para o professor. O professor, então, reconhece a ignorância e diz:
_ Esse mar não conheço. Mas, posso lhe dizer como explorei mares não conhecidos. Assim, você pode explorar também mares que não navegou.
Nessa passagem Rubem Alves ilustra, com uma imagem tão bela, a segunda fase da vida do professor que Roland Barthes chamou da fase de ensinar o que não sabe. Sugerir caminhos para que o estudante, de forma autônoma, construa seu próprio conhecimento. Assim, interpreto o que me dizem Alves e Barthes.
O episódio de ontem me lembra que os jovens também são navegantes que me ajudam a navegar mares desconhecidos. Ainda bem que a conexão não se perdeu.
Generosos, Leandro e Rodrigo, me guiam por mares que desejo explorar. Entro na terceira fase da vida do professor que Barthes chamou da fase do esquecer o que sabe. É o esquecimento que permite o rearranjo da forma de ver o mundo. Esse rearranjo depende de explorar novos mares. Muitos mares!
Sigo nessa viagem. Quase sempre bem acompanhado de outros marinheiros que compartilham comigo seus saberes.
Que a conexão não seja tão instável quanto a de Alexander e Dick é o que desejo. À falta de uma bússola, me guio pelos que já exploraram mares desconhecidos.

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