sábado, 8 de janeiro de 2022

Crônicas na Holanda 13 - Flanando por Utrecht

Para hoje, a previsão era de chuva a partir das 13 horas. Pela manhã, sem chuva. Porém, com temperatura entre 2 e 3 graus centigrados. Mudança de plano. Ao invés de mais um passeio a um parque, acompanhado de alguns petiscos e vinho, tive a ideia de darmos um passeio com primeiro e último destinos pré-determinados. Iríamos até o Fort De Bilt, uma parte da antiga linha de defesa aquática das cidades. Ao final do passeio, uma rápida passada em um supermercado para uma compra pequena. Entre os dois, flanar pela Utrecht nessa manhã fria de sábado.

Dar chance ao acaso. Errar, vagar, perambular. Tantos os sinônimos para algo que sempre gostei de fazer. Desde minha primeira viagem internacional, já adulto, quando fui para Helsinki. Após a chegada no hotel pela manhã, ao final da tarde vaguei a esmo pela vizinhança do hotel. Dos tempos pré-internet, em 1988, guardo na memória a visão de um kioski. Tão diferente de nossas bancas de jornais e sucos que à época eram comuns em Londrina. Em especial no entorno da Catedral e pelo Calçadão. Mas, tinha a semelhança da finalidade, além da possível na tradução em português, quiosque. O kioski finlandês vendia lanches e, também, revistas.

Ficou na memória! Possivelmente, reimaginado hoje, decorridos quase 34 anos. Será mesmo precisa a imagem que dele tenho? Ou terá se amalgamado aos tantos quiosques que ao flanar pelas cidades desse vasto mundo, mesmo não sendo Raimundo, sempre me tocaram profundo. Gosto de quiosques, mas hoje não vi nenhum. No entanto, em Utrecht os há. Em especial os que vendem brodjes (sanduíches). São mais frequentes no centro de Utrecht.

Certa vez, comprei um brodje em um deles, quando, perto da hora do almoço, caminhava em direção à faculdade de economia da Utrecht University para uma reunião. Antes da mudança para cá. Ainda morando em Amsterdam, havia chegado de trem. A partir da estação central ferroviária, 40 minutos de caminhada. Com um breve intervalo, naquele dia para um almoço em estilo holandês. Me disseram que, para a maioria dos habitantes desse país, o almoço é muito frugal. Em geral, uma fruta ou um brodje.

A caminhada até o forte foi de apenas 20 minutos. Depois voltamos em direção à Bilt Straat. Bastava andarmos em linha reta, a partir do forte, voltando parte do caminho que fizéramos. Dez minutos depois passávamos em frente ao Het Hoogeland, um dos prédios que aparecem na imagem que ilustra esta crônica. Fica junto ao Oorsprongpark, que já trilhamos algumas vezes.

Depois, na próxima esquina esse prédio com uma poesia na parede. Ao chegar em casa, descubro que é um dos inúmeros poemas de Ingmar Heytzen que ornam paredes em Utrecht. Fazem parte do projeto Straatpoëzie (Poesia na rua), coordenado pela poeta. Deem uma googlada que acharão facilmente o site na internet. 

Na próxima esquina, sugiro virarmos à direita. Conhecemos bastante a Biltstraat, pois também já a percorremos inúmeras vezes. Mas, à direita naquela esquina nunca havíamos ido. O segredo do flanar está em ir aonde jamais esteve. Dar chance ao acaso, como disse acima. Ao final na rua, uma curva suave à esquerda, à beira de um canal. Seguimos por ele. Para nossa surpresa, o caminho nos levou ao Grift Park em que estivéramos no último sábado.

A partir dali, passando por vielas e ruelas nunca por nós percorridas, acabamos retornando à Biltstraat. Breve pausa para um chocolate quente. Depois seguimos em direção ao Teatro Municipal, o que nos levou à esquina em que está o Villa Orloff. Restaurante que se tornou nosso preferido por aqui. Já estivemos nele inúmeras vezes, antes do lockdown. Resolvi que ele merecia estar na fotografia da crônica. As imagens dos canais que também ilustram a crônica, não são de hoje. Mas, passamos perto deles em outros dias. Às vezes sob um fraco sol e brilhante céu azul. Em outras, mais para o nublado. A cada momento, com sua própria beleza que vou registrando a esmo. Fotografias que surgem do prazer de flanar e do olhar curioso e inquieto.

Virando à esquerda de quem olha para o Villa Orloff, começamos o retorno para casa. Depois de 15 minutos, a parada breve no supermercado. Um pouco antes, comprarmos pão em uma das inúmeras padarias que nos tentam pelo caminho. Pequenos prazeres cujas consequências são tratadas à base de caminhadas! Ao chegar em casa, resolvo googlar a poeta da parede e encontro seu site. A poesia, como já suspeitava, devido aos pés que a acompanham, de certa forma, homenageia o flanar. Será que forço a barra? Julgue você mesmo pela tradução que me ofereceu o google translator e, na qual fiz pequenos ajustes:   

Hoe vaak je ook ging    Não importa quantas vezes você foi

Even vaak kwam je aan    Você chegou com a mesma frequência

Jeder spoor blyft bestaan    Sua trilha continua existindo

Waar je was legt je vast    Você marca onde você esteve


Geen stap diz je zet    Nenhum passo que você dá

Wordt ooit overgedaan    Alguma vez será refeito

Je bent hier nog niet weg    Você ainda não saiu daqui

Of je komt er vandaan    Ou você vem de lá

2 comentários:

  1. Olá Fernando e Edra, gosto muito de ler suas crônicas, assim vou conhecendo um pouco desse país que deve ser muito lindo. Saudades de vocês um grande abraço. Amelia

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  2. Obrigado tia Amélia. Saudades também. Abraço

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