sábado, 24 de setembro de 2016

Manhã de Sábado

Anna é apresentadora de um noticiário de algum canal de tv na Dinamarca. Com Erik, arquiteto e professor, é mãe de Freja, uma adolescente, entre quatorze e quinze anos. Os três vão ver a casa que Erik herdou com a morte do pai. A princípio a ideia é vende-la. Mas, Anna convence que devem morar na casa. Fazer uma comunidade de amigos. Erik resiste à ideia. Anna diz que já falou com Ole, amigo do casal.
Assim começa o filme dinamarquês "Comunidade" que assisti hoje de manhã no cinema. A comunidade vai se formando aos poucos. O último a se juntar a ela é Allon. Imigrante, se comunica com dificuldade na língua do país. A mesma dificuldade que enfrenta em conseguir trabalho. Sua renda vem de trabalhos avulsos e incertos. Questionado por que quer se juntar à comunidade, de forma surpreendente e incompreensível para todos, responde e logo após começa a chorar:
_ Eu preciso chegar.
Mais uma vez, como já me aconteceu antes, penso comigo:
_ Esta pequena frase vai me fazer escrever algo.
O que eu não podia prever, a essa altura do filme, é que, mais à frente, em outra cena, mais uma pequena frase se juntaria a esta.
Erik se mostra ser um professor arrogante. Após ter humilhado um aluno durante uma aula, é procurado e questionado por Emma. Terceiro-anista que cursava sua disciplina sobre Arquitetura Racional. Não faço a mínima ideia do que isso seja.
Depois de questionar Erik, Anna quer discutir seu projeto com o professor. Algo inspirado na arquitetura de Le Corbusier. De forma, de novo, aparentemente arrogante, Erik afirma que não deve ter nada dela no projeto. No entanto, mesmo um professor arrogante, pode ser um educador eficaz. Nem sempre, é minha opinião. Na verdade, raras vezes. Erik a questiona:
_ O que a empolga?
_ Não sei, Emma responde.
A pergunta de Erik, mais do que a resposta de Emma, junta-se à fala de Allon. O filme, que já ganhara minha simpatia nas cenas iniciais, me seduz por completo. É um filme que instiga a reflexão sobre a vida.
Terminado o filme, nessa manhã de sábado, o primeiro da primavera de 2016, caminho em direção à Praça Ozório, no centro de Curitiba. Penso em algum lugar para almoçar. A princípio, busco algum lugar com comida japonesa. Ao chegar à praça, me decido pela feijoada light do Arrumadinho. Outra opção seria a comida árabe do Armazém Califórnia. Mas, já estive lá outro dia. Por uma feliz coincidência encontrei Thálita, Marcos e Eduardo. Doutorandos em Administração da UFPR. Tornaram menos solitário meu almoço naquele dia. Companhia agradável de jovens inteligentes que essa vida de professor me permite encontrar.
Há treze dias estou sózinho em Curitiba. Sara foi para Maringá fazer companhia à mãe que teve um problema de saúde. Amanda viajou tambêm. Sobramos Tobias, um gato persa, e eu. Entre os miados dele, tento adivinhar se tem fome ou quer um cafuné. Adora um cafuné. Eu não durmo sem lhe dar um pouco. Sempre sobe à cama quando me deito. De vez em quando ainda está lá quando acordo.
Mas, volto a esta manhã de sábado. Peço meia feijoada. O garçom me informa que será 70 porcento do preço da inteira. O que fazer? Não vou dar conta de uma inteira. Uma caipirinha foi pedida antes. Essa é inteira!
No caminho do cinema até o Arrumadinho me vejo refletido na vitrine de uma loja. Todo de azul. Calça jeans e camisa azul de mangas compridas. Ao sair de casa, a manhã de primavera ainda estava um pouco fria. Até os aros de meus óculos são azuis. Gosto do azul, mas os óculos foram escolha de Sara. Compondo com o azul, o grisalho de cabelos e barba. Não me pareceu uma figura feia. Na verdade, me surpreendi com o que vi.
Não sei por que, minha memória me levou para algum período entre 1974 e 1976. Nesses anos, entre os 17 e 19 de idade, vivi em São Paulo, primeiro, e depois, São José dos Campos. Muitas vezez me desloquei, sózinho, para a região da Consolação e Paulista. Ia ao cinema. Sempre sózinho. A paixão pelo cinema, que começou na adolescência, aumentou nesses anos.
Desde então, me parece, que assim como Allon, preciso chegar. Mas, não sou um imigrante. Aonde preciso chegar? 
Ao que me empolga. Esta é a resposta. Diferentemente de Emma, creio saber a resposta. O bom disso tudo é saber que a vida é o que me empolga. Nada pode ser melhor.
E, enquanto professor, vivo a esperança de poder ser útil na descoberta do que pode empolgar aqueles que estudam comigo. 
Depois da segunda caipirinha é hora de pagar a conta. Preciso comprar a ração do Tobias. Hoje pela manhã, antes de sair, servi a última porção. Se não comprar, terei certeza que à noite, mais do que cafuné, o miado significará fome. Ou saudade da Sara, que nunca deixa faltar a ração.
Pena que não sei miar. Saudades de Sara

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