domingo, 13 de março de 2016

No Inter 2

A narrativa começa pelo final. É como no Bonsai, pequeno romance de Alejandro Zambra. Ao mesmo tempo que enuncia o final, o narrador não sabe como tudo começou. Em Bonsai, sabia. É uma diferença. Outra é o estilo.
O final é um silêncio. Tão enfático que parece que posso ouvi-lo. No Inter 2, sentido Hauer, o silêncio dele chama minha atenção. Mais do que todos os fragmentos de conversas das outras pessoas que quase lotam o ônibus.
Antes de desligar o celular, essa foi sua fala:
_ Você está fazendo drama por que? Por que eu não fiquei com você ontem? Por que eu não dormi com você? Desliga então. É fácil, não é? Simples. Para você tudo é simples. Tchau.
Calou-se.
Como que ele pode deixar a situação chegar a esse ponto? Pergunto aos meus botões. Nenhuma resposta. Percebo que estou de camiseta.
Passo a especular. Ele não devia ter desligado o celular ontem durante o futebol com os amigos. Depois, foram ao bar. Beberam muito e foi pra casa do Juca. Só lembrou do celular de manhã.
Que mulher acreditaria nessa história? Não ia nem contar. Mas, ela estava uma fera. Não quis ouvir nada. Começou a fazer drama. Perdeu a paciência. Prefiriu ser irônico.
Acho que já estava querendo terminar a relação. No entanto, seu silêncio denso me sugere que não.
Pode ter sido diferente. Ele embarcou no tubo do Centro Politécnico. Hoje teve seminário de Cálculo Diferencial Avançado. No último final de semana ela não deixou ele estudar. Desligou o celular para fazer a série de 42 exercícios que a professora passou. Era meio louca. A professora. A outra, a do celular, estava obcecada por ele. Se conheceram na sexta-feira de Carnaval. Foram cinco dias de muito sexo. Lembrou-se da frase machista que seu pai dizia:
_ Amor de pica, fica!
Os últimos dez exercícios terminou deitado na cama. Quase duas horas da manhã. Ligou o celular e viu aquele monte de chamadas. Virou pro lado e pensou em voz alta:
_ Deu merda! Amanhã depois da aula eu ligo.
Virou pro outro lado e dormiu.
Que mulher acreditaria nessa história? Preferiu ser irônico.
Parece que não deu certo. No silêncio dele, senti uma certa saudade. Não sei se alguém já disse:
_ Amor de xana, inflama!
Pode ser que não seja nada disso. Se quiser, invente você o seu começo. Está chegando meu tubo de destino.

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