segunda-feira, 2 de outubro de 2023

O epilético da Praça João Mendes

Manhã de segunda em São Paulo. Antes de meu retorno a Curitiba, previsto para o meio da tarde, caminho em direção à Praça da Liberdade. Google maps estima 30 minutos para alcançá-la. Meu ponto de partida é o hotel em que me hospedei por uma semana. Nas proximidades do Parque Augusta.
Na Praça João Mendes, uma breve parada no Sebo do Messias. Busco um livro autobiográfico de Nair de Teffé publicado em 1974. Não o encontrei. Porém, memórias do tempo vivido no Bairro da Liberdade, nesse mesmo ano, me (re)encontraram.
Aos 17 anos, morava na Pensão de Dona Genoveva e Seu Orlando. Meu último ano do que agora chamam Ensino Médio. Também complementava a educação no Anglo, me preparando para os três vestibulares que enfrentei. Bem sucedido, pude escolher o que parecia a escolha correta. Sobre isso já escrevi em outra ocasião. Talvez, mais de uma.
Hoje, a memória vem também de 1974. Muito provavelmente, em uma lanchonete que já não existe mais. Era vizinha de onde se encontra o Sebo do Messias, fundado em 1969, cinco anos antes de minha vinda para a Liberdade. Mas, ainda viva na tinta de minha lembrança, expressão que empresto de Walter Firmo, o fotógrafo. Vinda para a Liberdade! Que frase de significados múltiplos! Eu aos 17 anos! Mas, esse não é o mote da memória de hoje.
Certa noite, provavelmente retornando de alguma sessão de cinema, talvez no Cine Jóia que ficava nas proximidades, antes de retornar à pensão que ficava na rua Tamandaré, resolvi fazer um lanche. A lanchonete tinha em seu centro, um balcão em forma de u. Havia também mesas espalhadas em cada canto do salão. Me acomodei em um dos bancos ao redor do balcão.
É muito provável que tenha pedido um beirute de rosbife, sanduíche que aprendi a comer em São Paulo. Seria um pedido frequente nos tempos em que vivi na Heitor Penteado, número 1310, Edifício Octavius. Do número do apartamento já não me lembro. Foram seis meses em 1982. Quando comecei meu mestrado na USP. Ao lado do prédio, havia também uma lanchonete. Inúmeras vezes, quando voltava das aulas, parava na lanchonete para comer um beirute. De rosbife. Sempre! Depois subia para o apartamento e aguardava a chegada de meu amigo José Antonio com quem dividia o apartamento, junto com sua irmã Renata e a amiga Sônia. Ontem, por acaso, um motorista de Uber, me levando ao encontro das filhas, Fernanda e Paloma, na casa de Telma e Luis, passou justamente neste endereço.
Volto, porém, à lanchonete na Praça João Mendes. Alguns minutos depois, um homem sentou-se ao meu lado. A lanchonete não estava cheia, e o fato me incomodou um pouco. Mas, como diria naquela época, fiquei na minha!
Meu beirute chegou. Comecei a comê-lo. De repente, o cara do meu lado caiu e começou a tremer. Teve um ataque epilético. Meu coração disparou e fiquei paralisado. Sem saber o que fazer. Para minha sorte, um dos atendentes deu volta ao balcão e permaneceu algum tempo segurando o homem caído para que suas convulsões não lhe causassem qualquer ferimento. Me disse, que ficasse tranquilo. Era um freguês habitual e logo se recuperaria.
Consegui terminar de comer o beirute. Paguei a conta. E comecei o caminho de volta à pensão. Foram os mais longos 1.300 metros que caminhei! Ao longo da rua Galvão Bueno na Liberdade, meu espírito foi se tranquilizando. Naquele domingo, sozinho em meu quarto, não pude contar o ocorrido para ninguém. Conto pra você hoje. 

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